Nesta cápsula vamos aprender a diferenciar entre as correntes materialistas e idealistas, porqué é que os idealismos são as correntes favorecedoras das classes dominantes, da burguesia no capitalismo, e porqué é que há uma dialética entre ambas formas de pensamento ao longo de toda a história da filosofia. Também analisaremos brevemente as características que definem o materialismo dialético e histórico e porqué é que é a filosofia acaída para a classe trabalhadora poder transformar a realidade.
O MATERIALISMO é a corrente filosófica que afirma que a matéria enquanto realidade objetiva é independente da consciência humana, é o fundamento de toda a existência. Todos os fenômenos — incluindo os mentais e sociais — são produto da matéria, a sua organização e o seu próprio auto-movimento.
Temos portanto dous elementos comuns a toda filosofia materialista:
A primazia da matéria: A matéria existe independentemente da consciência humana, e a consciência é um reflexo ou produto de processos materiais.
Enfoque no mundo real: O materialismo busca entender o mundo tal como ele é, através da observação e análise da realidade objetiva, em oposição a explicações sobrenaturais, espirituais ou abstratas.
O IDEALISMO polo contrário, coloca a consciência, o espírito ou as ideias como o elemento primário e determinante da realidade. Para os idealistas, a realidade material é, de alguma forma, subordinada ou derivada da consciência. São as correntes que historicamente preferem as classes dominantes. A maioria das filosofias burguesas são de tipo idealista.
No idealismo os elementos comuns são:
A primazia da ideia: A consciência (ou “espírito”, no sentido hegeliano) é considerada como o fundamento da existência, e a matéria é vista como secundária ou até ilusória, no idealismo mais subjetivo.
Ênfase no pensamento: A realidade objetiva é muitas vezes interpretada como uma projeção ou construção do pensamento humano.
Tipos Fundamentais de Materialismo
O materialismo evoluiu ao longo da história da filosofia, assumindo diferentes formas e características. Desde o marxismo identificam-se três grandes tipos de materialismo: mecanicista, vulgar, e dialético e histórico
- Materialismo Mecanicista (Pré-marxista): Nasceu a partir do desenvolvimento material da física clássica e newtoninana, como produto das ideias e dos avanços científicos que trouxo a mecânica de Newton, e descreve a realidade em termos de leis fixas, mecánicas e deterministas. Considera a matéria como passiva, lineal e imutável, e ignora as contradições internas próprias da matéria que geram o seu auto-movimento ou o desenvolvimento espontâneo, e também desconsidera a dinâmica histórica e as interações dialéticas que impulsam a transformação da realidade.
- Materialismo vulgar ou dogmático: é uma forma simplista e reducionista de materialismo que tenta explicar todos os fenômenos, inclusive os sociais e culturais, exclusivamente a partir de causas materiais diretas, ignorando mediações, contradições ou a complexidade das relações entre a matéria o pensamento e a sociedade, caíndo em determinismo ou reducionismo. Este materialismo vulgar simplifica excessivamente os processos históricos e sociais. Um exemplo clássico de materialismo vulgar seria a interpretação grosseira de que “as ideias são um reflexo direto e mecânico da base material”. Outro exemplo: para este materialismo vulgar, a superestrutura (o político, cultural, jurídico…) é vista como um mero reflexo automático da base material (estrutura económica), e considera dogmaticamente que mudando a base material muda-se automatica e completamente a superestrutura, em lugar de perceber que existe uma relação de interação dialética e influência ou acção mútua e recíproca entre esta base material e a superestrutura. Características principais do materialismo vulgar:
- Reducionismo: Reduz fenômenos complexos, como ideias, valores e cultura, a reflexos diretos de condições materiais, sem considerar as interações dialéticas. Exemplo: Afirmar que “as ideias religiosas existem apenas porque as pessoas são economicamente exploradas”, sem examinar a relação histórica e dialética entre os dous elementos.
- Falta de Dialética: Ignora as contradições e os processos de transformação qualitativa da realidade. Enxerga a realidade como estática e linear, sem incorporar a dinâmica histórica.
- Determinismo Simplista: Supõe que a infraestrutura econômica determina de maneira mecânica e unidirecional toda a superestrutura (cultura, política, religião, etc.). Não tem presente como as ideias e instituições podem reagir sobre a infraestrutura.
A fundamental crítica marxista ao materialismo vulgar é que este é incapaz de compreender a relação dialética entre base material e superestrutura. Não considera que as ideias, instituições e práticas culturais têm relativa autonomia e podem influenciar as condições materiais.
Um exemplo clássico citado em muitas fontes marxistas é o de Engels, em uma carta a Joseph Bloch em 1890, onde esclarece que o materialismo histórico não significa que a economia é a única causa dos fenômenos sociais, mas sim que é a base a partir da qual se desenvolvem as contradições e interações.
“… Segundo a concepção materialista da história, o momento em última instância determinante [in letzter Instanz bestimmende], na história, é a produção e reprodução da vida real. Nem Marx nem eu alguma vez afirmámos mais. Se agora alguém torce isso [afirmando] que o momento económico é o único determinante, transforma aquela proposição numa frase que não diz nada, abstracta, absurda. A situação [Lage] económica é a base [Basis], mas os diversos momentos da superstrutura [Uberbau] — formas políticas da luta de classes e seus resultados: constituições estabelecidas pela classe vitoriosa uma vez ganha a batalha, etc, formas jurídicas, e mesmo os reflexos [Reflexe] de todas estas lutas reais nos cérebros dos participantes, teorias políticas, jurídicas, filosóficas, visões [Anschauungen] religiosas e o seu ulterior desenvolvimento em sistemas de dogmas — exercem também a sua influência [Einwirkung] sobre o curso das lutas históricas e determinam em muitos casos preponderantemente [vorwiegend] a forma delas. Há uma acção recíproca [Wechselwirkung] de todos estes momentos, em que, finalmente, através de todo o conjunto infinito de casualidades (isto é, de cousas e eventos cuja conexão interna é entre eles tão remota ou é tão indemonstrável que nós a podemos considerar como não-existente, a podemos negligenciar), o movimento económico vem ao de cima como necessário. Senão, a aplicação da teoria a um qualquer período da história seria mais fácil do que a resolução de uma simples equação do primeiro grau.”
3. Materialismo Dialético (Marxista): é o materialismo desenvolvido por Karl Marx e Friedrich Engels, este é sim um materialismo dinâmico que entende a matéria em constante movimento e transformação, regida por contradições internas, por unidades de contrários. As formações materiais e os procesos históricos desenvolvem-se apartir do seu próprio auto-movimento, que nasce a partir das suas contradições internas, das unidades de contrários presentes em toda a matéria. Este materialismo sim reconhece a inter-relação entre o mundo material e o pensamento humano, enfatizando a dialética como método de análise.
Princípios Fundamentais do Materialismo Dialético
Primazia da Matéria: A matéria é a realidade objetiva, independente da consciência humana. A mente, ideias e consciência são produtos do desenvolvimento da matéria organizada, especialmente do cérebro humano. A consciência é apenas uma propriedade emergente da matéria.
Leis principais da Dialética:
Unidade e luta de contrários: Todas as cousas contêm contradições internas (opostos em tensão), que são a força motriz do movimento e da sua própria transformação.
Transformação da quantidade em qualidade: Pequenas mudanças acumuladas (quantidade) levam a mudanças qualitativas abruptas, como saltos na evolução ou transformações sociais, como as revoluções. Um exemplo clássico citado por Engels no Anti-Dühring: a água que ferve ou se congela ao atingir uma determinada temperatura, produz um salto qualitativo, muda qualitativamente de estado, e o resto de aumentos ou reduções quantitativas degrau a degrau, supõem apenas mudanças quantitativas, não qualitativas (de estado).
Negação da negação: O desenvolvimento ocorre em ciclos de superação, onde algo é negado, mas aspectos positivos do que foi negado são preservados e elevados a um nível superior (aufheben= termo hegeliano que em alemão condensa ambas ideias de superação-conservando parte do velho).
Interconexão ou concatenação universal dos fenómenos e Interdependência: Nada existe isoladamente; todas as cousas estão conectadas em uma Totalidade dinâmica. Os fenômenos só podem ser compreendidos nas suas relações e contradições mútuas.
Mudança e Movimento: Tudo está em constante processo de movimento, transformação e desenvolvimento. A mudança não é linear, mas ocorre por meio de saltos qualitativos provocados por tensões internas.
Historicidade: A realidade não é estática, mas historicamente construída e transformada pola práxis humana. A história humana é a história da transformação da natureza polo ser humano através do trabalho. As relações sociais e econômicas mudam ao longo do tempo, em resposta a contradições internas na sociedade.
Diferença entre Materialismo Dialético e o mecanicista e vulgar e com o idealismo.
Materialismo Dialético vs Materialismo Mecanicista e vulgar:
O materialismo mecanicista e o vulgar vem o mundo como um sistema fixo de causas e efeitos lineares, ignorando as contradições e o desenvolvimento qualitativo. O materialismo dialético, por outro lado, entende o movimento como algo essencialmente contraditório e dinâmico.
Materialismo Dialético vs Idealismo: O idealismo coloca a consciência ou o espírito como a origem da realidade. O materialismo dialético argumenta que a matéria precede a consciência, embora reconheça que a consciência (e as ideias) tem um papel ativo na transformação da realidade.
“Não é a consciência dos homens que determina seu ser, mas, polo contrário, o seu ser social é o que determina sua consciência.” Karl Marx
Por que há uma luita dialética entre Materialismo e Idealismo na Filosofia?
Desde Hegel e o desenvolvimento do marxismo, essa tensão entre as correntes idealistas e materialistas ao longo de toda a história da filosofía é interpretada como uma luita entre opostos dialéticos. O progresso da matéria, a sociedade e o pensamento ocorre através de contradições e superações dialéticas. Na história da filosofia, do pensamento, isto se reflete no combate entre correntes materialistas e idealistas, que representam visões opostas sobre a primazia da matéria ou da consciência (ideias e pensamento). Essa oposição reflete uma contradição entre diferentes abordagens para compreender o mundo, sendo a idealista a mais funcional para as classes dominantes. No modo de produção capitalista, se para transformar o mundo é preciso primeiro mudar as ideias (o pensamento), a burguesia é a única classe que, libertada do trabalho e tendo reservada para ela o tempo e a capacidade do pleno desenvolvimento intelectual, seria capaz de transformar e fazer progressar a sociedade, vedando assim a transformação na praxe real e material à classe trabalhadora por medio da revolução, a transformação verdadeira através da dialética entre a mão e a mente.
Assim, a luita filosófica entre materialismo e idealismo é uma expressão da luita real entre forças e condições materiais na história. A História é o campo de batalha, e o combate á hegemonia do idealismo na filosofia é também o combate à alienação humana em sociedades de classes, confrontándomos a estas correntes a filosofia do materialismo dialético e histórico que nos legaram os grandes pensadores marxistas.